O caso de ataques racistas em um
perfil da atriz Taís Araújo chamou, mais uma vez, nossa atenção para os crimes
de injúria racial que ocorrem em nosso país. Por mais que se deseje propagar a
imagem de que o Brasil é um país cordial e acolhedor, nossos números nos
colocam em comparação com nações que vivem em declarada guerra civil. Basta que
pensemos no número de homicídios que ocorrem nas nossas metrópoles, na
quantidade de desaparecidos e de crimes nunca solucionados.
Há lugares onde o toque de
recolher não foi oficialmente decretado por bandidos, mas existe na vida dos
cidadãos. A violência que antes era acompanhada com temor em programas como
aquele apresentado por Datena agora bate na porta das casas do interior, onde
jovens são assaltados em plena luz do dia.
Entre a crise econômica e a crise
política, existe aquela que dura séculos e dá sinais de que poderá persistir,
inexorável, pelas próximas décadas: a crise de valores.
Nossa herança histórica é marcada
pelo colonialismo, pela figura do Senhor, do Coronel e das gentes subalternas.
Toda nossa estrutura política preserva os moldes assistencialistas e
clientelistas da República Velha. Nossas leis atestam coisas que a prática
renega. E na mentalidade popular ainda existem lugares reservados para brancos
e negros. Se nossa elite econômica esconde seu preconceito, nossa classe-média
não se esforça tanto.
Basta lembrar dos ataques
racistas desferidos pela estudante de direito Mayara Petruzo contra nordestinos
ao final de uma eleição onde o candidato de sua preferência foi derrotado nas
urnas. Mayara foi punida, mas os centenas de usuários que a apoiaram e teceram
comentários ainda piores escaparam impunes.
Maju Coutinho, a simpática
jornalista que divulga a previsão do tempo, também foi vítima de racistas.
Antes dela jogadores de futebol e artistas foram vítimas do mesmo ódio. Parece
que as redes sociais passam a errada impressão de que nelas tudo é permitido.
Pouco a pouco o conjunto de leis têm se adaptado a essa nova categoria de
agressão, mas por mais que se criem códigos de conduta, nenhum deles será
efetivo se nossa educação também não mudar. E não falo de ensino, falo de
educação mesmo, daquela que vem de casa, com os mais profundos conceitos do que
é certo e errado, de como se deve tratar outros seres humanos. Repetindo um
conceito difundido popularmente: “ninguém nasce preconceituoso, é levado a
sê-lo”.
Hoje todos querem ser Taís. Todos
se colocam contra o preconceito. Vale a pena pensar nesses que se colocam
contra o racismo mas defendem shoppings exclusivos, camarotes reservados e não
querem que aeroportos se pareçam com rodoviárias, como certa vez descreveu uma
professora da Pontifica Universidade Católica(!!!) ao deparar-se com um homem
de camiseta e bermuda que esperava para embarcar.
Muitos acham intolerável o
preconceito com Taís, mas parecem se esquecer que ele é apenas uma das inúmeras
serpentes que compõe o cabelo da Medusa. Não basta postar “somos todos Taís”.
Precisamos difundir outro tipo de cultura, incentivar nobres comportamentos e
jamais esquecer dos Amarildos. Amarildo Dias de Souza, ajudante de pedreiro,
foi detido pela polícia na porta de sua casa e levado na direção de uma Unidade
de Polícia Pacificadora. Desapareceu no caminho. O preconceito chama mais atenção
quando é contra uma pessoa que alcançou o estrelato, mas é ignorado quando
atinge babás, porteiros, cozinheiras, diaristas e tantos outros trabalhadores.
Precisamos combater o preconceito
dos braços do Estado, que sempre prioriza áreas nobres das grandes cidades,
fornece segurança a investidores e protege a propriedade privada. Abandonar a
apatia é um começo, cobrar mudanças estruturais deve ser uma meta.
Não basta ser Taís, deve-se lutar
para não haver Amarildos.
Emerson Luiz
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